sexta-feira, 19 de abril

Imago Dei

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O capítulo de abertura da nossa Bíblia é a história emocionante da criação e formação, que lança as bases para tudo o que vem depois. Conta-se que, “no princípio”, a terra, o nosso lar no universo, era sem forma e vazia, coberta de água e envolta em trevas, enquanto o Espírito de Deus pairava sobre as águas (versículo 2). À medida que os dias da criação se desenrolaram, Deus deu forma à terra e a preencheu. Ele separou o dia da noite, as águas acima das águas de baixo, e a terra seca das águas de baixo. Deus encheu esses ambientes, colocando luzes no céu para separar o dia da noite, formando criaturas viventes para nadar nas águas de baixo, e pássaros para voar no céu acima, e fazendo com que a terra produzisse seres vivos sobre a terra seca. Finalmente, como o ato culminante, Deus criou um outro tipo de ser vivo, o homem.

O foco da narrativa recai claramente sobre essa criatura. Este não foi apenas o ato final da criação, mas um quarto da história é centrado nele. Algo muito especial e muito importante está diante de nós.

O capítulo divide a totalidade dos seres em duas categorias básicas: o Criador e a criação. Deus é o Senhor de tudo, aquele que não foi criado, mas é o criador dos céus e da terra. Todo o resto é criado e, portanto, finito, temporal, dependente e mutável. Alguns são seres vivos (plantas e animais). Alguns têm o fôlego de vida neles (versículo 30). Nesse grupo está o homem. Assim como outros membros do grupo, o homem é criado em ambos os sexos e chamado para ser frutífero, multiplicar-se e encher a terra (versículos 22, 28). Outras semelhanças poderiam ser notadas (cabelo sobre a pele, as mulheres dão à luz as suas crias e as amamentam, e assim por diante). Mas com todas as semelhanças que podem ser notadas, há algo sobre o homem que o distingue bastante de todas as outras criaturas.

A vegetação que Deus fez brotar da terra seca (versículo 11) é o primeiro ser vivo a ser mencionado. Em seguida, vêm as criaturas que vivem nos mares e os pássaros que voam no ar (versículo 20), gado, animais que rastejam e animais selvagens(v. 24). Eles são todos formados conforme a sua espécie. Esta frase ocorre dez vezes e deixa uma impressão de destaque na narrativa. Indica que, enquanto há uma grande diversidade entre todos os seres vivos, há grupos entre os que compartilham características comuns, formando como que “famílias” de coisas, com a distinção moderna entre gênero e espécie. No entanto, o objetivo principal da frase não é muito de nos apresentar o trabalho científico de taxonomia, mas sim fornecer a base necessária para trazer um contraste dos seres humanos com todos os outros seres vivos.

Quando Deus faz o homem, ele quebra o padrão que estabeleceu durante a criação de seres vivos conforme a sua espécie. A menção repetida dez vezes deste padrão nos leva a esperá-la em cada nova criatura viva que aparece, mas algo completamente diferente acontece quando o homem é feito, ele não é criado “conforme a sua espécie”. Também não é criado conforme qualquer outra espécie entre os seres vivos. Dessa forma, o homem não pertence às suas espécies, qualquer que sejam as semelhanças que existam entre ele e as outras criaturas. Em uma linguagem científica moderna, ele não é uma espécie em particular dentro de um determinado gênero de criaturas viventes. O homem é diferente de quaisquer outros seres vivos (versículo 26). Por mais surpreendente que seja, o homem é criado conforme a “espécie” de Deus, criado à imagem de Deus (imago Dei). O homem, assim como Deus, é um ser pessoal. O próprio Deus, segundo a Bíblia revela mais tarde, é três pessoas que compartilham uma única essência divina. As pessoas humanas são seres criados e, nesse sentido (como em outros), são semelhantes e compartilham características com os outros seres criados. Mas o que é mais importante sobre a pessoa humana é a sua semelhança com Deus. Essa semelhança é tão especial que os diferencia de todas as outras criaturas que Deus fez. O homem não é feito conforme as suas espécies, ele é feito conforme a “espécie” de Deus. Em outras palavras, o homem é criado à imagem e semelhança de Deus.

Tendo a imago Dei, as pessoas humanas recebem uma medida de soberania sobre toda a terra, com o domínio sobre os peixes do mar, as aves do céu, o gado e todos os animais rastejantes (versículo 28). Eles também são responsáveis por sujeitar a terra (versículo 28). A linguagem sugere um domínio, uma posição mesmo de conquista, conforme o Salmo 8 deixa claro (ler os versículos 5-8.). Todas as coisas são colocadas debaixo dos pés do homem, mas a tirania e exploração estão fora de cogitação. Gênesis 2:4-25 mostra que o homem deve seguir o exemplo de Deus em sua administração da terra. Deus planta um jardim no Éden e coloca o homem ali para trabalhar e guardá-lo (2:8, 15). O que Deus inicia, o homem deve manter e cultivar. Deus nomeia a luz, dia e a escuridão, noite; ele chama o firmamento do céu e as águas do mar (1:5, 8, 10). Agora Deus comissiona o homem a dar nomes a todas as criaturas viventes que ele fez (2:19).

Apesar de não usar o vocabulário de imagem e semelhança, Gênesis 2 tem sua própria maneira de ressaltar a singularidade das pessoas humanas em meio a todos os seres viventes. Quando Deus criou o homem do pó e o colocou no jardim, ele declarou que não era bom que o homem ficasse sozinho. Então, Deus determinou a criação de uma auxiliadora semelhante a ele (2:18). Após esta declaração solene, Deus apresentou ao homem todos os animais que ele tinha criado, para que o homem pudesse dar nomes a eles. Por que este desfile de animais diante do homem? Por que Deus não criou a mulher imediatamente? O que parece ser uma interrupção na história está, na verdade, trazendo de volta a motivação da história: “para o homem, todavia, não se achava uma auxiliadora que lhe fosse idônea” (versículo 20). O ponto é que os seres humanos, de fato, não pertencem ao grupo dos animais, quaisquer que sejam as características que eles compartilhem. Não se pôde encontrar entre todos os animais uma auxiliadora semelhante a Adão, um ser criado da mesma espécie que ele, com a qual ele pudesse cumprir o chamado de Deus. Assim sendo, Deus criou uma mulher, que era “osso dos [seus] ossos e carne da [sua] carne” (versículo 23). Como Adão, ela foi criada à imagem e semelhança de Deus (1:28). Juntos, eles deviam trabalhar no cumprimento do trabalho de Deus de serem fecundos, multiplicarem-se e encherem a terra, e sujeitá-la. Deus fez o primeiro homem e a primeira mulher, mas todos os outros seres humanos passaram a existir através deles. Aquilo que Deus fez agora devia ser continuado pelo homem e pela mulher, tendo eles sido criados à imagem e semelhança de Deus.

Tragicamente, o homem e a mulher se afastaram de Deus e caíram em pecado, buscando tornar-se ainda mais parecidos com Deus (3:5) a fim de escolherem por eles mesmos o que é bom e mau. A imagem de Deus foi desfigurada. Embora criados corretamente, eles buscaram muitas complicações (Eclesiastes 7:29). Seus descendentes também carregariam essa imagem desfigurada (Romanos 5:12-21).

No entanto, a imagem de Deus não foi totalmente perdida, e o que resta ainda é suficiente para sustentar a santidade da vida humana que baseia-se na imago Dei. Gênesis 9:6 mostra que tirar a vida humana inocente é um ataque à imagem de Deus, por isso deve ser punida com a morte. O homem, sendo imagem de Deus, deve ser um doador de vida, não um tomador de vidas inocentes. Quando nos tornamos assassinos, contradizemos o nosso propósito na vida e perdemos a proteção divina que normalmente nos cobre. Tão especial é a nossa vida para Deus que mesmo um animal é condenado à morte se tira a vida de um ser humano (Gênesis 9:5, Êxodo 21:28-32).

Além disso, como devemos temer a Deus e glorificá-lo através de nossas palavras, então não devemos nunca amaldiçoar os que são criados à semelhança de Deus (Tiago 3:9). Toda a ética humana é baseada na imago Dei. Os maridos devem amar suas esposas como Cristo amou a igreja (Efésios 5:25-27). Os pais devem disciplinar e instruir seus filhos como o Senhor faz aos filhos dele (6:4). O amor reconfortante de uma mãe é a imagem e semelhança do amor reconfortante de Deus (Isaías 66:13). Os senhores da Terra devem refletir a justiça e a equidade encontradas no Mestre celestial (Efésios 6:9; Colossenses 4:1). Embora o pecado tenha desfigurado muito a imagem de Deus em nós, pela graça de Deus em Cristo essa imagem é renovada (Efésios 4:24; Colossenses 3:10). Ao vivermos por meio dessa graça, as pessoas veem nossas boas obras e glorificam ao nosso Pai que está nos céus (Mateus 5:16). Quando a nossa restauração for concluída, viveremos para sempre na presença de Deus, revestidos de sua glória (Apocalipse 21-22), tendo verdadeiramente nos tornado a sua “espécie” de pessoas. Graças sejam dadas a Deus.


Autor: Mark Ross

Mark Ross é deão e professor associado de teologia sistemática no Erskine Theological Seminary, situado na Carolina do Sul, EUA. Ele também é diretor do Institute for Reformed Worship.

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