Thomas Watson – Sobre o Amor a Deus [2/3]

O Voltemos ao Evangelho está traduzindo o livro Um Tônico Divino, do puritano Thomas Watson. Confira os capítulos já traduzidos:

  1. As melhores coisas cooperam para o bem [Parte 1 | Parte 2 | Parte 3 | Parte 4 | Parte 5]
  2. As piores coisas cooperam para o bem [Parte 1 | Parte 2 | Parte 3 | Parte 4 | Parte 5 | Parte 6 | Parte 7 | Parte 8]
  3. Por que todas as coisas cooperam para o bem do homem piedoso? [Parte 1 | Parte 2 | Parte 3]
  4. Sobre o Amor a Deus [Parte 1 | Parte 2 | Parte 3]
  5. Os Testes do Amor a Deus [Parte 1 | Parte 2 | Parte 3 | Parte 4 | Parte 5 | Parte 6]

4. As propriedades do amor.

(i) O nosso amor a Deus deve ser íntegro, e assim, no que concerne ao sujeito, ele deve ser de todo o coração. “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força” (Mc 12.30). Sob a antiga lei, o sumo sacerdote não poderia casar-se com uma viúva nem com uma meretriz – não com uma viúva, pois ele não teria dela o seu primeiro amor; nem com uma meretriz, pois ele não teria dela todo o seu amor. Deus há de possuir todo o nosso coração.“O seu coração está dividido” (Os 10.2, ARC). A verdadeira mãe não permitiria que a sua criança fosse dividida ao meio, e Deus não aceitará o coração dividido. Deus não há de ser um hóspede, para ter apenas um quarto em nosso coração, deixando para o pecado todos os demais aposentos. O nosso amor deve ser íntegro.

(ii) O nosso amor a Deus deve ser sincero. “A graça seja com todos os que amam sinceramente a nosso Senhor Jesus Cristo” (Ef 6.24). “Sincero” alude ao mel que é completamente puro. O nosso amor a Deus é sincero quando é puro e sem interesse egoísta; a isso os escolásticos chamam “um amor de amizade”. Nós devemos amar a Cristo, como diz Agostinho, por quem Ele é: assim como nós amamos o vinho suave pelo seu sabor. A beleza e o amor de Deus devem ser os dois ímãs que atraem o nosso amor para Ele. Alexandre tinha dois amigos, Heféstion e Crátero, a respeito de quem dizia: “Heféstion me ama porque eu sou Alexandre; Crátero me ama porque eu sou o rei Alexandre”. Um amava quem ele era, o outro amava o que ele possuía. Muitos amam a Deus porque Ele lhes concede trigo e vinho, e não por Suas excelências intrínsecas. Nós devemos amar a Deus mais por aquilo que Ele é do que por aquilo que Ele concede. O verdadeiro amor não é mercenário. Você não precisa pagar para que uma mãe ame o seu filho; assim também uma alma em profundo amor a Deus não precisa ser remunerada por recompensas. Ela não pode outra coisa, senão amar a Deus por aquele brilho de formosura que reluz Dele mesmo.

(iii) O nosso amor a Deus deve ser fervoroso. A palavra hebraica para “amor” significa “ardência de afeição”. Os santos devem ser serafins, queimando em puro amor. Amar alguém friamente é o mesmo que não amá-lo. O sol brilha tão forte quanto lhe é possível. O nosso amor a Deus deve ser intenso e veemente, como brasas vivas de zimbro, que são as mais agudas e ferventes (Sl 120.4). O nosso amor pelas coisas transitórias deve ser indiferente; nós devemos amá-las como se não as amássemos (1Co 7.30). Mas o nosso amor a Deus deve ser inflamado. A esposa desfalecia de amor a Cristo (Ct 2.5). Nós nunca podemos amar a Deus como Ele merece. Assim como a punição de Deus é sempre menor do que nós merecemos, assim o nosso amor a Ele é sempre menor do que Ele merece.

(iv) O nosso amor a Deus deve ser ativo. Ele é como fogo, o qual é o mais ativo dos elementos; a isso o apóstolo chama “o trabalho do amor” (1Ts 1.3, ARC). O amor não é uma dádiva preguiçosa; ele torna a mente disposta para estudar a Deus e os pés para correrem no caminho dos Seus mandamentos. “O amor de Cristo nos constrange” (2Co 5.14). Pretensões de amor são insuficientes. O verdadeiro amor não é visto apenas na ponta da língua, mas na ponta dos dedos; isso é o trabalho do amor. Os seres viventes mencionados em Ezequiel 1.8 tinham asas, e isso é um emblema do bom cristão. Ele não apenas tem as asas da fé para voar, mas também tem mãos sob as asas: ele trabalha por amor, ele gasta e se deixa gastar por Cristo.

(v) O nosso amor a Deus é liberal. Ele possui provas de amor a conceder (1Co 13.4). A caridade é benigna. O amor não apenas possui uma língua suave, mas um coração benigno. O coração de Davi estava inflamado de amor a Deus, de modo que ele não iria oferecer a Deus aquilo que não lhe custasse nada (2Sm 24.24). O amor não é apenas cheio de benevolência, mas de beneficiência. O amor que dilata o coração nunca fecha as mãos. Aquele que ama a Cristo será liberal em favor dos Seus membros. Ele será olhos para o cego e pés para o aleijado. As costas e o ventre dos pobres devem ser os sulcos onde ele semeia as preciosas sementes da liberalidade. Alguns dizem amar a Deus, mas o seu amor é aleijado de uma mão: eles nada dão para boas aplicações. Com efeito, a fé lida com coisas invisíveis, mas Deus odeia aquele amor que é invisível. O amor é como vinho novo, que precisa ser arejado; e ele areja a si mesmo por meio de boas obras. O apóstolo fala, em honra aos macedônios, que eles haviam dado aos santos pobres não apenas na medida de suas posses, mas mesmo acima delas (2Co 8.3). O amor é uma nobre dádiva de liberalidade.

(vi) O nosso amor a Deus é peculiar. Aquele que é um amante de Deus tem por Ele um amor tal, que não concede a mais ninguém. Assim como Deus tem por Seus filhos uma espécie de amor que não concede aos ímpios – um amor eletivo, de adoção –, assim também um coração gracioso tem por Deus um amor tão distinto e especial, do qual ninguém pode compartilhar. “Visto que vos tenho preparado para vos apresentar como virgem pura a um só esposo, que é Cristo” (2Co 11.2). Uma mulher casada com um único marido tem por ele tal amor, que não possui por nenhum outro; ela não divide o seu amor conjugal com ninguém, exceto com seu marido. Assim também um santo desposado com Cristo tem por Ele uma peculiaridade de amor, um amor incomunicável a qualquer outro, isto é, um amor combinado com adoração. Não apenas o amor é dado a Deus, mas a própria alma. “Jardim fechado és tu, irmã minha, esposa minha” (Ct 4.12). O coração de um crente é o jardim de Cristo. A flor que nele cresce é o amor unido à divina adoração, e essa flor é para o desfrute de Cristo, somente Dele. A esposa guarda a chave do jardim, para que ninguém possa nele entrar, exceto Cristo.

(vii) O nosso amor a Deus é permanente. Ele é como o fogo que as virgens vestais mantinham em Roma: jamais se apaga. O verdadeiro amor ferve e transborda, mas não desiste. O amor a Deus, à medida que é sincero e sem hipocrisia, é também constante e sem apostasia. O amor é como o pulso do corpo, sempre batendo; não é como uma terra seca, e sim como uma enchente de primavera. Os homens ímpios são constantes no amor ao pecado: nem a vergonha, nem a doença, nem o temor do inferno os fará desistir de seus pecados; assim também, nada pode impedir o amor de um cristão a Deus. Nada pode derrotar o amor, nenhuma dificuldade ou oposição. “O amor é forte como a morte” (Ct 8.6). A sepultura engole os corpos mais robustos; assim também o amor supera as maiores dificuldades. “As muitas águas não poderiam apagar o amor” (Ct 8.7). Nem as doces águas do prazer, nem as águas amargas da perseguição. O amor a Deus agüenta firme até à morte. “Estando vós arraigados e alicerçados em amor” (Ef 3.17). Coisas leves, tais como a palha ou as penas, são facilmente arrastadas, mas uma árvore arraigada suporta a tempestade; assim também aquele que está arraigado em amor pode resistir a todas as coisas. O verdadeiro amor nunca acaba, enquanto há vida.

Por Thomas Watson. Original: A Divine Cordial By Thomas Watson

Tradução: voltemosaoevangelho.com

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